Roman Columns

Por Jürgen Büehler
Traduzido por Julia La Ferrera

No coração de sua epístola à Igreja em Roma, o apóstolo Paulo dedica três capítulos inteiros ao relacionamento entre Israel e os cristãos gentios. No entanto, seus ensinamentos sobre Israel vão muito além dos capítulos 9 a 11 e podem ser encontrados em todo o livro de Romanos.

No capítulo 1, versículo 16, Paulo imediatamente proclama que o evangelho é “primeiro do judeu, e também do grego”. No capítulo 2, ele aborda a questão da identidade judaica e o benefício da circuncisão. Então, no capítulo 3, Paulo coloca duas vezes a questão de saber se há alguma vantagem em ser judeu, o que ele responde afirmativamente. O capítulo 4 explica como Abraão – o primeiro patriarca hebreu – alcançou a justiça. Mais adiante no capítulo 14, Paulo trata das leis dietéticas judaicas e no capítulo 15 ele explica as relações Israel-Igreja de acordo com as profecias do Antigo Testamento e a responsabilidade cristã para com Israel. Finalmente, no capítulo 16, Paulo encerra sua epístola maravilhado com o mistério há muito oculto do Evangelho, que “foi dado a conhecer a todos os gentios, levando à obediência da fé”.

Israel é, portanto, um tema que ressoa em toda a sua mensagem aos cristãos romanos, mais do que qualquer outra de suas outras cartas às igrejas da Ásia Menor. Isso levanta a questão: Por que Paulo escreveu mais sobre esse assunto para a igreja romana? A razão pode ser encontrada em uma passagem muitas vezes esquecida: “Saudai Priscila e Áquila, meus cooperadores em Cristo Jesus”. (Romanos 16:3)

A Expulsão de Roma

Priscila e Áquila foram cooperadores de Paulo por vários anos. No livro de Atos, encontramos este casal devoto pela primeira vez quando Paulo chega à cidade grega de Corinto.

“Depois disto, deixando Paulo Atenas, partiu para Corinto. Lá, encontrou certo judeu chamado Áquila, natural do Ponto, recentemente chegado da Itália, com Priscila, sua mulher, em vista de ter Cláudio decretado que todos os judeus se retirassem de Roma.” (Atos 18:1-2).


O casal ajudou Paulo a estabelecer a igreja em Corinto e mudou-se com ele para Éfeso, onde permaneceram ativamente envolvidos na plantação de igrejas ao lado de Paulo. Como ele, eles eram seguidores de Jesus de descendência judaica. Em Atos, afirma-se que eles foram forçados a deixar Roma porque o imperador Cláudio havia expulsado todos os judeus de Roma.

O historiador romano Suetônio confirma este evento e o historiador da igreja primitiva Orosius dá a data como o ano 49 d.C. Outros até o colocam já em 41 d.C. Esta expulsão não foi um caso isolado. Apenas algumas décadas antes, Tibério havia expulsado todos os judeus de Roma para a ilha da Sardenha.

Suetônio explica que a expulsão ocorreu por causa dos “distúrbios e tumultos entre os judeus por instigação de Chrestus”. A maioria dos historiadores da igreja hoje concorda que isso se refere a Cristo. Os cristãos também eram frequentemente chamados de “Chrestianoi”. Aparentemente, havia uma disputa interna entre os moradores judeus de Roma sobre as reivindicações messiânicas de Jesus, como havia acontecido em Jerusalém (Atos 8:1), Antioquia (Atos 15:50); Icônio (Atos 14:1-7), Tessalônica e Beréia (Atos 17), e em outros lugares. Mas Cláudio teve pouca tolerância com o debate e expulsou todos os judeus.

Isso incluiu Priscila e Áquila, que fugiram para Corinto, onde se encontraram com Paulo. Por vários anos, eles se juntaram à sua equipe ministerial, mudando-se com ele para Éfeso. Mas quando um novo imperador surgiu em Roma chamado Nero, ele permitiu que os judeus retornassem em 54 d.C. Priscila e Áquila voltaram nessa época, razão pela qual Paulo os cumprimenta no final de sua carta.

A Primeira Igreja Gentia

A expulsão dos judeus de Roma é, portanto, de importância central na compreensão da mensagem de Paulo à igreja local. A igreja em Roma já existia muito antes de Paulo chegar lá. Como outras igrejas naquelas primeiras décadas do movimento, muitos dos congregados e, sem dúvida, a maioria dos professores eram judeus. Eles eram os mais versados nas Sagradas Escrituras, que naquela época consistiam apenas nos escritos do Antigo Testamento. Assim, quando Cláudio decidiu expulsar os judeus de Roma, incluindo aqueles que acreditavam em Jesus, isso significava que a igreja em Roma era provavelmente a primeira inteiramente composta por gentios. Isso deve ter apresentado um grande desafio. Todos os professores e presbíteros que os instruíam todos os sábados se foram!

No entanto, o Espírito Santo também estava com eles e os cristãos gentios conseguiram manter a igreja em Roma intacta e crescendo por conta própria por um tempo. Isso provavelmente trouxe um novo senso de confiança, pois eles descobriram que a igreja ainda poderia operar sem os judeus.

Tensões com o Retorno a Roma

Mas então o imperador Nero permitiu que os judeus voltassem e, sem dúvida, as tensões se desenvolveram. Priscila e Áquila estavam entre aqueles que voltaram para sua congregação de origem, onde provavelmente encontraram uma mudança de atitude em relação a eles e seus irmãos judeus.

O contexto histórico sugere fortemente que Paulo escreveu à igreja em Roma para colocar as coisas em ordem e resolver as tensões entre a nova liderança gentia e os congregados judeus que retornavam.

Por exemplo, vemos Paulo advertindo firmemente os gentios a não esquecerem que suas raízes espirituais estão no judaísmo. Isso começa mesmo em sua saudação inicial, onde ele os lembra que Jesus “nasceu da semente de Davi segundo a carne”. Mas no capítulo 2, ele também aconselha os judeus que retornam a liderar mais pelo exemplo do que pelas palavras. E no capítulo 14, ele aborda questões sobre as leis dietéticas judaicas que parecem ter surgido.

Ainda assim, o principal objetivo da carta é direcionado aos cristãos gentios e sua necessidade de respeitar as raízes judaicas de sua fé. Paulo enfatizou que os oráculos, alianças e propósito redentor de Deus começaram séculos antes com o povo judeu. Além disso, ele deixou claro que o Messias não era um cidadão romano, mas descendente da linhagem real do rei Davi.

A igreja romana se viu em um conflito entre judeus e gentios do qual talvez nunca tenha se recuperado. Eventualmente, encontramos Priscila e Áquila de volta a Éfeso, onde Paulo os cumprimenta novamente em 2 Timóteo 4:19. Enquanto isso, várias décadas depois, a igreja em Roma tornou-se o terreno fértil para a teologia da Substituição, pois um dos maiores hereges da Igreja primitiva – Marcião de Sinope – surgiu da comunhão em Roma.

Ele ensinou lá de 137 até 144 d.C., e sustentou que o Deus do Antigo Testamento era de vingança e ira, enquanto o Deus do Novo Testamento era uma Deidade diferente, de amor e misericórdia. E até mesmo alguns dos livros do Novo Testamento eram “judeus” demais para ele.

Marcião foi finalmente expulso da igreja, mas acabaria levando consigo um grande número de cristãos gentios. O impacto de suas doutrinas errôneas, baseadas na rejeição de nossas raízes judaicas porque Israel rejeitou amplamente Jesus, é sentido até hoje.

Dr. Büehler é o Diretor Internacional da Embaixada Cristã Internacional em Jerusalém

Este comentário foi originalmente publicado na edição de maio de 2010 do The Jerusalem Post Christian Edition